Política: a participação jovem na Era Digital
O fraco envolvimento cívico e político das gerações mais jovens tem sido muitasvezes apontado como uma justificação para a crescente taxa de abstençãoeleitoral global, o recrudescer da coesão social ou até mesmo para justificarcampanhas inflamatórias de superioridade entre gerações - num discurso quepromove não mais do que o afastamento dos jovens daquilo que é “político” e acrispação social entre gerações
O fraco envolvimento cívico e político das gerações mais jovens tem sido muitas vezes apontado como uma justificação para a crescente taxa de abstenção eleitoral global, o recrudescer da coesão social ou até mesmo para justificar campanhas inflamatórias de superioridade entre gerações - num discurso que promove não mais do que o afastamento dos jovens daquilo que é “político” e a crispação social entre gerações. Mas, como em todos os dilemas sociais, é no confronto dos factos que encontramos porventura a mediana que melhor explica o estado da participação da juventude atual, na qual os ambientes digitais tem ganho preponderância.
De acordo com um estudo do Observatório Permanente da Juventude intitulado “Sub-Representação de uma Geração: Jovens na Assembleia da República, Governo e Parlamento Europeu (1976-2019)” (2021) existe uma sub-representação crónica das gerações jovens (18-35 anos) na vida política nacional que se tem acentuado desde a segunda legislatura. A título de exemplo, a média de idades dos deputados à Assembleia da República cresceu de 40 para 48 anos entre 1976-2019, com prevalência do grupo de deputados acima dos 50 anos na última legislatura (1976: 81 jovens/230 deputados; 2019: 35 jovens/230 deputados). Conclui-se ainda que o ideal de representação política descritiva está longe de ser alcançado, com menos de 20% de jovens em qualquer órgão de representação política. A questão da sub-representação de jovens nos lugares de poder – local, nacional ou europeu – e a taxa de abstenção jovem - que de acordo com as duas sondagens elaboradas para o Conselho Nacional de Juventude (eleições presidenciais e eleições autárquicas 2021) que rondam os 50% -, deixam ainda antever que a juventude não tem sido um nicho eleitoral, pelo que as temáticas que lhe interessam não têm sido priorizadas no discurso político. Tal traduz-me num desfasamento entre a realidade político-mediática e a realidade do dia-a-dia dos jovens, favorecendo o descrédito na classe política e deixando as novas gerações à mercê de visões iliberais da democracia.
Outro estudo, intitulado “Os jovens em Portugal, hoje” da Fundação Francisco Manuel dos Santos publicado em novembro de 2021, mostra-nos também que os jovens se dizem descrentes das estruturas clássicas de participação, mas admitem ter um posicionamento político-ideológico, que nem sempre corresponde ou encontra eco nos partidos políticos atuais. O facto de os jovens não se reverem nas estruturas atuais de representação, empurra-os para outras formas de participação como os movimentos informais e as petições, não se furtando, no entanto, do seu sentido cívico e das suas preocupações económicas, sociais e ambientais. Podemos então concluir que a perceção de alheamento da juventude não é totalmente correta, mas sim que existe um afastamento da juventude das instituições e atores formais da democracia portuguesa.
Se o discurso político poderia fazer a diferença na motivação dos jovens para a sua participação efetiva nas estruturas formais, também os meios de comunicação com o possível eleitorado dos diferentes atores políticos merecem ser repensados. Em plena transição digital e num momento de amplo acesso às redes sociais e a outros fóruns digitais, a presença das instituições públicas nos meios digitais é ainda excessivamente formal, morosa e pouco individualizada, tendo por isso pouco impacto. No extremo oposto, assistimos a discursos incendiários e à utilização das mesmas redes por atores políticos que promovem a política do soundbite e não o esclarecimento. Assistimos à utilização de fake news como estratégia política, ou ao crescimento de movimentos populistas conservadores; à política de identidade elevada a um extremo ou ao culto do líder em detrimento da ideologia. Todos estes fenómenos demonstram tempos que não se coadunam entre si – o da política e o dos novos meios de comunicação de massas -, para os quais é preciso encontrar um mesmo compasso.
O digital tem hoje um potencial importante para aproximar ou afastar cidadãos, em particular os jovens. A janela de comunicação sem intermediários que promove entre decisores e cidadãos, a promessa de interação constante, as formas que permite de prestação de contas entre eleitores e eleitos, o potencial para refrescar os discursos e pivôs políticos, para mencionar apenas alguns fatores, ditam a importância do digital nos sistemas políticos do século XXI. Mas apenas uma comunicação eficaz - no tempo, na forma e na mensagem – conseguirá garantir que o digital é utilizado para fortalecer e não ferir de morte a democracia.
Rita Saias, Professora de “Sistemas Políticos e Eleitorais” na Pós-graduação em Marketing Político e Comunicação Digital.
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